Sim aos direitos<br>Não à mistificação e à mentira
Conforme dizíamos há uns meses atrás, uma enorme inquietação percorre os militares. É uma inquietação que tem como causas próximas as recentes medidas do governo PS, mas tem como causas profundas anos de golpes fundos nos direitos e regalias dos militares.
Não está em causa, como alguns comentadores de serviço vão dizendo, a sua incompreensão face aos problemas do país. Está em causa a incompreensão dos sucessivos governos perante as especificidades das FFAA. Não está em causa a sua incompreensão perante a situação do déficit e o quererem ficar à margem dos esforços para o superar. Está em causa que desde há anos são penalizados em nome dos problemas do país, mas os problemas do país mantém-se. Mais, está em causa a mentira sistemática, a insinuação das mordomias e dos privilégios, como método.
É extensa a lista das tropelias praticadas pelos sucessivos governos: complemento de pensões congelado; aumento de vencimentos congelado; progressão nas carreiras congeladas para milhares de militares; cortes em medicamentos comparticipados; subsídios não pagos; situação dos chamados ex-combatentes por resolver; fundo de pensões em falência porque os imóveis militares foram sendo vendidos mas a lei não foi respeitada; aglutinação do Cofre de Previdência no IASFA sem passar cavaco a ninguém, naquilo que se pode apelidar, em linguagem da direita, de nacionalização selvagem; aumentos em 40 e 50% nas rendas de casa e valores das creches existentes no âmbito do apoio social; corte nos efectivos e tendência crescente para a desvalorização funcional dos militares; não cumprimento das regras estabelecidas em matéria de higiene, segurança e saúde nos locais de trabalho, etc., etc. Tudo em nome do interesse nacional. Tudo em nome dos sacrifícios. Os militares não querem ser uma casta privilegiada, mas não se lhes pode exigir especiais deveres igualando, retirando, direitos. Se as políticas de direita, do centrão, tratam os militares nos planos dos direitos e das relações como funcionários públicos, só podem esperar idêntica atitude dos militares.
O Governo e alguns comentadores, falam da Condição Militar para justificar o cerceamento de direitos, mas ignoram essa mesma condição para efeito de direitos; dizem (por exemplo, António José Teixeira), pasme-se, que matérias como reformas e saúde são matérias sindicais. Que tristeza.... E as carreiras bloqueadas, o que são? E tudo o resto, o que é? A técnica é antiga: carimba-se e a partir daí desenvolve-se a teoria à medida dos objectivos pré definidos. Em vez de olharem aos problemas, à sua profundidade, às propostas que ano após ano as associações militares têm feito chegar aos governos, à Assembleia da República e outros órgãos de soberania, optam pela via do «come e cala», optam pelo caminho da prepotência.
Fazendo lembrar outros tempos, lançam o anátema da instrumentalização. Militares que são tão considerados internacionalmente, que são tão reconhecidos, que são tão louvados, que são tão desejados (dizem os governos e Generais quando se trata do Iraque, do Kosovo ou do Afeganistão) passam de repente a mentecaptos, a rebeldes, qualquer dia, quem sabe, a terroristas, porque dizem não às medidas do governo, porque dizem que o governo não deve igualar o que é diferente.
Dizem que não podem convocar manifestações, mas podem participar em manifestações convocadas por outros. Isto é, podem participar em manifestações convocadas por sindicatos (pela Frente Comum, por exemplo), mas as estruturas associativas de militares não podem convocar manifestações, mesmo quando expressamente o fazem apelando ao traje à civil e sem uso de símbolos ou bandeira nacional. Tem isto qualquer cabimento? Tem em Portugal, neste Portugal com esta política, mas não tem na Alemanha, na Holanda, na Dinamarca, etc., países onde os militares até têm sindicatos. Alguém fala nesses países em coesão e disciplina? Falam cá porque não concebem, não entendem, não querem entender e têm raiva a quem entende, que uma coisa é a vida dentro dos quartéis e outra é fora dos quartéis. Que se conheça, os militares e desde logo os dirigentes associativos, nunca se recusaram a qualquer ordem militar legitima. São militares e cumprem! Ora, cá existem muitas reminiscências do passado, dos Chefes Militares como tutores dos militares. Isso acabou! É preciso reafirmá-lo.
A verdade, é que os militares continuam a ser olhados de soslaio, com desconfiança, por parte do PS e do PSD que já manifestou a sua solidariedade ao governo PS. Percebe-se: se a política e as orientações fundamentais são as mesmas, só se justifica que exista, como desde há muitos anos tem existido, este pacto entre o PS e o PSD. Foi assim, aliás, durante muitos anos para conseguir a alteração do artigo 31. Governos do PS e do PSD de Cavaco castigaram militares, sempre em nome da coesão e da disciplina, sempre agitando o espantalho do sindicalismo. Alguns continuam saudosos desse tempo e sempre que as circunstâncias propiciam, lá surgem rapidinhos a agitar os espantalhos. Bem pode Henrique de Freitas (PSD) tecer loas ao diálogo e à negociação, porque a realidade é que nem um só problema de Pessoal foi resolvido pelo governo PSD/CDS-PP. Mais, propaganda houve muita, medalhas foram aos magotes, mas os reais problemas ficaram todos por resolver, como oportunamente o PCP alertou.
O Governo PS foi lesto na proibição da manifestação convocada pelas estruturas associativas militares, mas limitou-se a acompanhar a manifestação racista e xenófoba do Martim Moniz, cuja Constituição da República expressamente proíbe, e autorizou a recente manifestação promovida pelo PNR com propósitos que claramente afrontam valores inscritos na Constituição da República. Serão precisos factos mais evidentes para pôr a nu a marca desta política e as razões fundas, que nada têm a ver com aspectos legais, para a proibição da manifestação dos militares?
Enquadramento legal
ignorado pelo Governo
A Lei Orgânica n.º4 / 2001 de 30 de Agosto diz o seguinte:
Artigo 31.º - C
Direito de manifestação
Os cidadãos referidos no artigo 31.º, desde que estejam desarmados e trajem civilmente sem ostentação de qualquer símbolo nacional ou das Forças Armadas, têm o direito de participar em qualquer manifestação legalmente convocada que não tenha natureza político-partidária ou sindical, desde que não sejam postas em risco a coesão e a disciplina das Forças Armadas.
Ora, foi à luz deste artigo que as associações militares convocaram a manifestação, portanto, no estrito cumprimento da lei. Aliás, em Junho, a Associação de Praças da Armada promoveu uma manifestação, com idêntico pedido ao Governo Civil, e não houve qualquer problema. Alguém deu conta de a coesão das FFAA ter sido abalada? Os militares deixaram de cumprir as missões de que foram incumbidos?
Por outro lado, a Lei Orgânica 3/2001 de 29 de Agosto – Lei do Direito de Associação Profissional dos Militares, estabelece no seu artigo 2.º o direito de estruturas associativas integrarem «comissões de estudo e grupos de trabalho(...)».
Ora, a verdade é que até hoje os sucessivos governos não têm cumprido a lei. Mas sobre tudo isto, os comentadores de serviço, nada dizem e o Ministro Luís Amado não fala verdade perante a opinião pública. O governo não ouve, tal como a lei o concebe, as associações. E o desafio fica aqui feito: o ministro que diga em qual grupo trabalho ou comissão participaram as associações ? E pode o ministro escolher o tema que quiser.
Apelou o Alm. CEMGFA, no passado dia 13/9, ao restabelecimento do diálogo institucional. Mas o Almirante esqueceu-se de um importante aspecto: é que no sábado anterior, o Primeiro-Ministro Sócrates, nas «Novas Fronteiras», afirmou que o governo «pode, quer e manda». Aonde fica o diálogo, Sr. Almirante? Ou será que esse apelo era dirigido ao governo? E que dizer do Director da Policia Judiciária Militar(PJM) tecendo considerandos sobre as associações e o associativismo? Já é crime dizer que não se concorda com o governo?
Em todo este conjunto de opiniões e concepções, encontramos muitas das respostas para a situação a que chegaram as FFAA e para a insatisfação existente no seu seio. Isto é, se somar-se aos sucessivos cortes em direitos, estas concepções retrogradas de relacionamento com os militares, temos o caldo de cultura para a insatisfação, o mal-estar, o tornar-se insuportável assistir «quedo e mudo» ao desenrolar dos acontecimentos.
Eis, portanto, uma importante reforma a fazer: a reforma das mentalidades que continuam predominantemente a procurar adiar o futuro. Mas promover essa reforma é empreender decididamente um outro rumo assente noutras opções.
A mentira como método
Há ilações a tirar
Como a notícia do jornal Diário de Noticias de sábado passado põe em evidência, o Governo e militares com altas responsabilidades mistificaram nas declarações que fizeram. Os extractos tornados à luz do dia pelo DN, mostram bem que as medidas do governo são tudo menos pacíficas, desde logo para os Estados-Maiores dos Ramos.
Os militares, os dirigentes associativos, ao contrário daquilo que alguns acham, sabem pensar. E se não suportam continuar a ser sujeitos a mais cortes nos direitos (enquanto assistem a nomeações por favor, a chorudos métodos de reforma para amigos de amigos instalados no governo) abominam a mentira usada como método de trabalho na relação com as estruturas associativas.
A verdade, é que as medidas do Governo não só lesam os militares (mas isso é óbvio) como deixam largos campos de indefinição que não podem deixar de gerar fortes preocupações quanto ao futuro.
Perante os factos tornados agora à luz do dia pelo DN, é uma evidência que as relações de confiança estão fortemente abaladas. Que militar acredita agora no ministro da Defesa? Que militar acredita agora nalguns altos responsáveis militares que vieram dizer estar tudo, no essencial, contemplado e, afinal, existe é um mar de preocupações? Ora, é isto mesmo que mina a coesão e a disciplina!
Por outro lado, torna-se evidente que as preocupações expressas pelas associações de militares têm fundamento. Quem têm alguns dos comentadores de serviço a dizer sobre isto?
Como repetidamente o PCP tem referido, os Chefes têm um dever de subordinação ao poder político e não de submissão. Aliás, a alteração do método de escolha das Chefias – do tempo dos governos de Cavaco – eliminando desse processo os ramos respectivos, constituiu mais um passo no sentido da governamentalização das FFAA. Mas mau será que o método se transforme em concepção e a concepção em prática. Que os governos queiram e gostem, percebe-se; que os Chefes assim ajam e se comportem, além de triste é mau para a Instituição.
As FFAA e os sacrifícios
Se outras fossem as opções políticas dos sucessivos governos, outra seria a realidade das FFAA. Para que precisa Portugal de uma 2.ª esquadra de F16 ? Como se justifica que na situação em que se encontram as finanças públicas, os submarinos sejam uma prioridade? Como se justifica a compra das fragatas Perry aos EUA, em 2.ª mão, e nas quais terão de ser gastos ainda uns milhões de euros? Estas são opções do governo PSD/CDS-PP, mas também do PS.
Mas a opção dos sucessivos governos é penalizar sempre os mesmos, é penalizar quem vive do seu trabalho. E não venham dizer que o PCP não defende o reequipamento das FFAA. O PCP sempre responsavelmente apresentou propostas nessa matéria e sempre o fez, no quadro da sua avaliação da situação nacional e daquelas que no seu entendimento deveriam/devem ser as prioridades. Foi o PCP que desde muito cedo considerou que Portugal devia possuir meios de defesa aérea com capacidade de intersecção e, por isso mesmo esteve de acordo com a 1.ª esquadra de F16. Assim como desde há mais de 20 anos defende a construção dos Patrulhões, processo que agora lá se vai desenrolando, embora muito lentamente, e outros exemplos poderiam ser dados. Mas as opções do PS, do PSD e do CDS-PP obedecem a um outro paradigma – o da participação e inserção externa. Não há meios adequados para a fiscalização e vigilância da nossa costa, mas tenham-se meios para cumprir os desígnios NATO. A Força Aérea está impedida de participar no combate a fogos por ausência de investimento nessa área e perca de qualificações dos pilotos, mas satisfaça-se as solicitações NATO. As opções que têm vindo a ser seguidas não partem do quadro, possibilidades e necessidades nacionais, partem dos conceitos e interesses NATO.
Ora, todos os analistas e comentadores de serviço, incluindo os versados em matérias económicas, colam-se às medidas do governo e acham bem o corte nos direitos dos militares e dos trabalhadores da administração pública em geral, mas passam por isto e tantos outros exemplos, como gato por vinha vindimada. E isto porque são opções política e ideológicas a determinar as medidas e os comentários e não a real análise à situação existente e aos caminhos para superar a situação. Repare-se: o governo anterior, com o apoio do PS, vedou o acesso directo à GNR, obrigando os jovens à passagem pelas FFAA. Agora, a GNR não tem o numero de jovens de que necessita e vai daí, acaba-se com essa obrigatoriedade. Alguém, alguma Instituição, consegue planificar o seu futuro assim?
Suspendam-se as medidas
Os militares, como não poderia deixar de ser e outra coisa não seria de esperar, perante a decisão do Tribunal Administrativo não promoveram a manifestação convocada para 13 de Setembro. Pretendendo atirá-los para a ilegalidade, as associações militares, os milhares de militares, contornaram o problema e encontraram maneira de convocar uma nova iniciativa para a passada terça-feira, dia 21 de Setembro, contornando as questões formais.
Não vamos aqui tecer considerações sobre determinadas concepções que de imediato surgiram dizendo que, os militares, não só não podem convocar como não podem participar. Isto é, segundo estes, nem o artigo 31 aprovado em 1982 pela mão de Freitas do Amaral chega, é preciso mesmo recuar ao antes do 25 de Abril. A questão fundamental é saber se para a saúde do regime democrático é mais saudável empurrar os militares para um jogo de fintas ou, frontal e claramente assumir direitos, com tudo o que isso comporta de regras para o seu exercício. Ora, cremos que não oferece dúvidas qual o caminho mais saudável, aliás, a exemplo do que sucede em muitos países por essa Europa fora.
No contexto da situação existente nas FFAA seria sensato suspender as medidas, analisá-las com mais rigor nos seus impactos, desde logo no que respeita ao Estatuto dos Militares, trabalhar integradamente estas matérias, envolver verdadeiramente as estruturas associativas nesse processo, procurando assim aliviar tensões. Isto é, remeter o processo à matriz a que devia ter obedecido desde o início e que o governo arrogante e sobranceiramente excluiu.
É extensa a lista das tropelias praticadas pelos sucessivos governos: complemento de pensões congelado; aumento de vencimentos congelado; progressão nas carreiras congeladas para milhares de militares; cortes em medicamentos comparticipados; subsídios não pagos; situação dos chamados ex-combatentes por resolver; fundo de pensões em falência porque os imóveis militares foram sendo vendidos mas a lei não foi respeitada; aglutinação do Cofre de Previdência no IASFA sem passar cavaco a ninguém, naquilo que se pode apelidar, em linguagem da direita, de nacionalização selvagem; aumentos em 40 e 50% nas rendas de casa e valores das creches existentes no âmbito do apoio social; corte nos efectivos e tendência crescente para a desvalorização funcional dos militares; não cumprimento das regras estabelecidas em matéria de higiene, segurança e saúde nos locais de trabalho, etc., etc. Tudo em nome do interesse nacional. Tudo em nome dos sacrifícios. Os militares não querem ser uma casta privilegiada, mas não se lhes pode exigir especiais deveres igualando, retirando, direitos. Se as políticas de direita, do centrão, tratam os militares nos planos dos direitos e das relações como funcionários públicos, só podem esperar idêntica atitude dos militares.
O Governo e alguns comentadores, falam da Condição Militar para justificar o cerceamento de direitos, mas ignoram essa mesma condição para efeito de direitos; dizem (por exemplo, António José Teixeira), pasme-se, que matérias como reformas e saúde são matérias sindicais. Que tristeza.... E as carreiras bloqueadas, o que são? E tudo o resto, o que é? A técnica é antiga: carimba-se e a partir daí desenvolve-se a teoria à medida dos objectivos pré definidos. Em vez de olharem aos problemas, à sua profundidade, às propostas que ano após ano as associações militares têm feito chegar aos governos, à Assembleia da República e outros órgãos de soberania, optam pela via do «come e cala», optam pelo caminho da prepotência.
Fazendo lembrar outros tempos, lançam o anátema da instrumentalização. Militares que são tão considerados internacionalmente, que são tão reconhecidos, que são tão louvados, que são tão desejados (dizem os governos e Generais quando se trata do Iraque, do Kosovo ou do Afeganistão) passam de repente a mentecaptos, a rebeldes, qualquer dia, quem sabe, a terroristas, porque dizem não às medidas do governo, porque dizem que o governo não deve igualar o que é diferente.
Dizem que não podem convocar manifestações, mas podem participar em manifestações convocadas por outros. Isto é, podem participar em manifestações convocadas por sindicatos (pela Frente Comum, por exemplo), mas as estruturas associativas de militares não podem convocar manifestações, mesmo quando expressamente o fazem apelando ao traje à civil e sem uso de símbolos ou bandeira nacional. Tem isto qualquer cabimento? Tem em Portugal, neste Portugal com esta política, mas não tem na Alemanha, na Holanda, na Dinamarca, etc., países onde os militares até têm sindicatos. Alguém fala nesses países em coesão e disciplina? Falam cá porque não concebem, não entendem, não querem entender e têm raiva a quem entende, que uma coisa é a vida dentro dos quartéis e outra é fora dos quartéis. Que se conheça, os militares e desde logo os dirigentes associativos, nunca se recusaram a qualquer ordem militar legitima. São militares e cumprem! Ora, cá existem muitas reminiscências do passado, dos Chefes Militares como tutores dos militares. Isso acabou! É preciso reafirmá-lo.
A verdade, é que os militares continuam a ser olhados de soslaio, com desconfiança, por parte do PS e do PSD que já manifestou a sua solidariedade ao governo PS. Percebe-se: se a política e as orientações fundamentais são as mesmas, só se justifica que exista, como desde há muitos anos tem existido, este pacto entre o PS e o PSD. Foi assim, aliás, durante muitos anos para conseguir a alteração do artigo 31. Governos do PS e do PSD de Cavaco castigaram militares, sempre em nome da coesão e da disciplina, sempre agitando o espantalho do sindicalismo. Alguns continuam saudosos desse tempo e sempre que as circunstâncias propiciam, lá surgem rapidinhos a agitar os espantalhos. Bem pode Henrique de Freitas (PSD) tecer loas ao diálogo e à negociação, porque a realidade é que nem um só problema de Pessoal foi resolvido pelo governo PSD/CDS-PP. Mais, propaganda houve muita, medalhas foram aos magotes, mas os reais problemas ficaram todos por resolver, como oportunamente o PCP alertou.
O Governo PS foi lesto na proibição da manifestação convocada pelas estruturas associativas militares, mas limitou-se a acompanhar a manifestação racista e xenófoba do Martim Moniz, cuja Constituição da República expressamente proíbe, e autorizou a recente manifestação promovida pelo PNR com propósitos que claramente afrontam valores inscritos na Constituição da República. Serão precisos factos mais evidentes para pôr a nu a marca desta política e as razões fundas, que nada têm a ver com aspectos legais, para a proibição da manifestação dos militares?
Enquadramento legal
ignorado pelo Governo
A Lei Orgânica n.º4 / 2001 de 30 de Agosto diz o seguinte:
Direito de manifestação
Os cidadãos referidos no artigo 31.º, desde que estejam desarmados e trajem civilmente sem ostentação de qualquer símbolo nacional ou das Forças Armadas, têm o direito de participar em qualquer manifestação legalmente convocada que não tenha natureza político-partidária ou sindical, desde que não sejam postas em risco a coesão e a disciplina das Forças Armadas.
Ora, foi à luz deste artigo que as associações militares convocaram a manifestação, portanto, no estrito cumprimento da lei. Aliás, em Junho, a Associação de Praças da Armada promoveu uma manifestação, com idêntico pedido ao Governo Civil, e não houve qualquer problema. Alguém deu conta de a coesão das FFAA ter sido abalada? Os militares deixaram de cumprir as missões de que foram incumbidos?
Por outro lado, a Lei Orgânica 3/2001 de 29 de Agosto – Lei do Direito de Associação Profissional dos Militares, estabelece no seu artigo 2.º o direito de estruturas associativas integrarem «comissões de estudo e grupos de trabalho(...)».
Ora, a verdade é que até hoje os sucessivos governos não têm cumprido a lei. Mas sobre tudo isto, os comentadores de serviço, nada dizem e o Ministro Luís Amado não fala verdade perante a opinião pública. O governo não ouve, tal como a lei o concebe, as associações. E o desafio fica aqui feito: o ministro que diga em qual grupo trabalho ou comissão participaram as associações ? E pode o ministro escolher o tema que quiser.
Apelou o Alm. CEMGFA, no passado dia 13/9, ao restabelecimento do diálogo institucional. Mas o Almirante esqueceu-se de um importante aspecto: é que no sábado anterior, o Primeiro-Ministro Sócrates, nas «Novas Fronteiras», afirmou que o governo «pode, quer e manda». Aonde fica o diálogo, Sr. Almirante? Ou será que esse apelo era dirigido ao governo? E que dizer do Director da Policia Judiciária Militar(PJM) tecendo considerandos sobre as associações e o associativismo? Já é crime dizer que não se concorda com o governo?
Em todo este conjunto de opiniões e concepções, encontramos muitas das respostas para a situação a que chegaram as FFAA e para a insatisfação existente no seu seio. Isto é, se somar-se aos sucessivos cortes em direitos, estas concepções retrogradas de relacionamento com os militares, temos o caldo de cultura para a insatisfação, o mal-estar, o tornar-se insuportável assistir «quedo e mudo» ao desenrolar dos acontecimentos.
Eis, portanto, uma importante reforma a fazer: a reforma das mentalidades que continuam predominantemente a procurar adiar o futuro. Mas promover essa reforma é empreender decididamente um outro rumo assente noutras opções.
A mentira como método
Há ilações a tirar
Como a notícia do jornal Diário de Noticias de sábado passado põe em evidência, o Governo e militares com altas responsabilidades mistificaram nas declarações que fizeram. Os extractos tornados à luz do dia pelo DN, mostram bem que as medidas do governo são tudo menos pacíficas, desde logo para os Estados-Maiores dos Ramos.
Os militares, os dirigentes associativos, ao contrário daquilo que alguns acham, sabem pensar. E se não suportam continuar a ser sujeitos a mais cortes nos direitos (enquanto assistem a nomeações por favor, a chorudos métodos de reforma para amigos de amigos instalados no governo) abominam a mentira usada como método de trabalho na relação com as estruturas associativas.
A verdade, é que as medidas do Governo não só lesam os militares (mas isso é óbvio) como deixam largos campos de indefinição que não podem deixar de gerar fortes preocupações quanto ao futuro.
Perante os factos tornados agora à luz do dia pelo DN, é uma evidência que as relações de confiança estão fortemente abaladas. Que militar acredita agora no ministro da Defesa? Que militar acredita agora nalguns altos responsáveis militares que vieram dizer estar tudo, no essencial, contemplado e, afinal, existe é um mar de preocupações? Ora, é isto mesmo que mina a coesão e a disciplina!
Por outro lado, torna-se evidente que as preocupações expressas pelas associações de militares têm fundamento. Quem têm alguns dos comentadores de serviço a dizer sobre isto?
Como repetidamente o PCP tem referido, os Chefes têm um dever de subordinação ao poder político e não de submissão. Aliás, a alteração do método de escolha das Chefias – do tempo dos governos de Cavaco – eliminando desse processo os ramos respectivos, constituiu mais um passo no sentido da governamentalização das FFAA. Mas mau será que o método se transforme em concepção e a concepção em prática. Que os governos queiram e gostem, percebe-se; que os Chefes assim ajam e se comportem, além de triste é mau para a Instituição.
As FFAA e os sacrifícios
Se outras fossem as opções políticas dos sucessivos governos, outra seria a realidade das FFAA. Para que precisa Portugal de uma 2.ª esquadra de F16 ? Como se justifica que na situação em que se encontram as finanças públicas, os submarinos sejam uma prioridade? Como se justifica a compra das fragatas Perry aos EUA, em 2.ª mão, e nas quais terão de ser gastos ainda uns milhões de euros? Estas são opções do governo PSD/CDS-PP, mas também do PS.
Mas a opção dos sucessivos governos é penalizar sempre os mesmos, é penalizar quem vive do seu trabalho. E não venham dizer que o PCP não defende o reequipamento das FFAA. O PCP sempre responsavelmente apresentou propostas nessa matéria e sempre o fez, no quadro da sua avaliação da situação nacional e daquelas que no seu entendimento deveriam/devem ser as prioridades. Foi o PCP que desde muito cedo considerou que Portugal devia possuir meios de defesa aérea com capacidade de intersecção e, por isso mesmo esteve de acordo com a 1.ª esquadra de F16. Assim como desde há mais de 20 anos defende a construção dos Patrulhões, processo que agora lá se vai desenrolando, embora muito lentamente, e outros exemplos poderiam ser dados. Mas as opções do PS, do PSD e do CDS-PP obedecem a um outro paradigma – o da participação e inserção externa. Não há meios adequados para a fiscalização e vigilância da nossa costa, mas tenham-se meios para cumprir os desígnios NATO. A Força Aérea está impedida de participar no combate a fogos por ausência de investimento nessa área e perca de qualificações dos pilotos, mas satisfaça-se as solicitações NATO. As opções que têm vindo a ser seguidas não partem do quadro, possibilidades e necessidades nacionais, partem dos conceitos e interesses NATO.
Ora, todos os analistas e comentadores de serviço, incluindo os versados em matérias económicas, colam-se às medidas do governo e acham bem o corte nos direitos dos militares e dos trabalhadores da administração pública em geral, mas passam por isto e tantos outros exemplos, como gato por vinha vindimada. E isto porque são opções política e ideológicas a determinar as medidas e os comentários e não a real análise à situação existente e aos caminhos para superar a situação. Repare-se: o governo anterior, com o apoio do PS, vedou o acesso directo à GNR, obrigando os jovens à passagem pelas FFAA. Agora, a GNR não tem o numero de jovens de que necessita e vai daí, acaba-se com essa obrigatoriedade. Alguém, alguma Instituição, consegue planificar o seu futuro assim?
Suspendam-se as medidas
Os militares, como não poderia deixar de ser e outra coisa não seria de esperar, perante a decisão do Tribunal Administrativo não promoveram a manifestação convocada para 13 de Setembro. Pretendendo atirá-los para a ilegalidade, as associações militares, os milhares de militares, contornaram o problema e encontraram maneira de convocar uma nova iniciativa para a passada terça-feira, dia 21 de Setembro, contornando as questões formais.
Não vamos aqui tecer considerações sobre determinadas concepções que de imediato surgiram dizendo que, os militares, não só não podem convocar como não podem participar. Isto é, segundo estes, nem o artigo 31 aprovado em 1982 pela mão de Freitas do Amaral chega, é preciso mesmo recuar ao antes do 25 de Abril. A questão fundamental é saber se para a saúde do regime democrático é mais saudável empurrar os militares para um jogo de fintas ou, frontal e claramente assumir direitos, com tudo o que isso comporta de regras para o seu exercício. Ora, cremos que não oferece dúvidas qual o caminho mais saudável, aliás, a exemplo do que sucede em muitos países por essa Europa fora.
No contexto da situação existente nas FFAA seria sensato suspender as medidas, analisá-las com mais rigor nos seus impactos, desde logo no que respeita ao Estatuto dos Militares, trabalhar integradamente estas matérias, envolver verdadeiramente as estruturas associativas nesse processo, procurando assim aliviar tensões. Isto é, remeter o processo à matriz a que devia ter obedecido desde o início e que o governo arrogante e sobranceiramente excluiu.